quinta-feira, 3 de julho de 2008

WALL-E

É RECORRENTE UM DEBATE COM MINHA NAMORADA SOBRE FILMES. Na discussão, ela acha que às vezes é bom um filme simplesmente divertido, onde você gaste um tempo para ver algo e achar legal. Eu normalmente defendo que o filme não deve ser apenas uma historinha divertida para passar o tempo. "Dizem" que o cinema é uma forma de arte, e como arte, a obra deve dizer algo, seja sobre uma idéia, seja sobre uma época ou apenas sobre o próprio artista. Quando a obra é realmente boa, ela também acaba dizendo algo sobre seu próprio observador/apreciador. E o melhor filme, eu argumento, é aquele que consegue fazer isso sem ser sobre isso. Filmes "advogados de causa" são documentários encenados. O bom filme é aquele que te faz pensar sem precisar pensar por você.

Não é fácil encontrar filmes assim no cinema tradicional americano (e é bem fácil encontrar filmes que pensam que são assim no cinema europeu e brasileiro). Mas as vezes encontramos. Com vontade de ir conhecer o cinema novo do "Belém Shopping" (Ex-Iguatemi), resolvi ir ver o filme novo da Pixar. Imaginei que ia ser muito divertido...




Veja aqui o trailer:



Wall-E é um filme fantástico. É desse tipo de filme que falo quando digo que um filme pode refletir sobre uma época, falar sobre algum tema sem soar panfletário (a maior parte do tempo, claro). Wall-E, o personagem (daqui por diante, vou chamar de Walle o personagem, e Wall-E o filme, para não confundir, ok?), nos faz pensar sobre o que está se fazendo nesse momento. A história do robozinho que fica na Terra sozinho para limpar um mundo afogado em lixo é uma reflexão fundamental sobre vários temas - desde a questão ambiental, o valor dado a objetos de consumo, até os relacionamentos interpessoais.

O espectador desatento pode passar batido sobre essas duas últimas questões. Mas Wall-E abusa muito bem das metáforas para criticar e refletir sobre o comportamento humano. Em uma cena, o robozinho acha uma caixinha de jóias, com um belíssimo anel de diamante dentro. Ele não tem dúvidas: joga o anel fora, e brinca com a caixa, muito mais interessante.

(pule esse parágrafo se não quiser saber spoilers sobre o filme)

Mais na frente, quando Walle viaja para a espaçonave onde os humanos estão refugiados, ele dá de cara com pessoas gordas e sedentárias, tão entrentidas com seus brinquedos tecnológicos e dedicadas a seguir a moda que sequer percebem uma pessoa com problemas na sua frente, ou olham para o lugar onde estão. Lá na nave, conhece um robozinho que, tentando realizar o que precisa, sofre para sair da linha e quabrar uma regra para seguir seu caminho.

(PODE VOLTAR A LER DAQUI)

Só marca bobeira quem acha que o filme trata-se de uma denúncia sobre o futuro, ou acha que trata-se de ficção científica. Bom, sim, é um filme de Ficção Científica, no sentido que se passa no futuro e seu personagem principal é um robô. Mas os temas do filme - o mundo sorterrado de lixo, o consumismo, a alienação do homem diante do mundo e do outro - são temas extremamente atuais. Os atos dos personagens que aparecem na terceira parte do filme, mais uma vez, são metáforas para as relações de hoje, onde pessoas entrentidas com seus brinquedos tecnológicos - que hoje talvez sejam laptops e ipods - acham estranho quando se permitem, pelo menos uma vez, tocar verdadeiramente uma nas outras.

Esteticamente, o filme é perfeito. Desde a paleta de cores, até os movimentos de câmera (sim! eles fazem isso em um filme de animação!) ao passo com o qual a história é contada é tudo muito bem feito.

Se eu pudesse falar mal de algo no filme (o que não me sinto 100% seguro para fazer), seria sobre o próprio personagem Walle. Veja só a carinha dele:

Sério... principalmente durante o começo do filme, mas em todo ele, eu olhava para o robozinho e tinha vontade de chorar. Acho que nunca numa animação conseguiram fazer um personagem tão expressivo quanto ele - e há de se lembrar que já fizeram animações em que o personagem tinha a cara do ator que faz sua voz. Wall-E, que por sinal não fala, só faz uma série de barulhinhos, interpreta muito melhor do que boa parte dos atores de Hollywood ou da Globo. Seu olhar caído, triste, transmite uma solidão que é difícil não se relacionar com ela. Junte isso a um bichinho curioso e muito, mas muito atrapalhado, e é lógico que eu achei ele minha cara. Como eu disse, é um filme que acaba falando não só de uma época, mas de seus espectadores (ou deste espectador específico) também.

O filme consegue falar de tudo isso em pouco mais de uma hora e meia de trapalhadas do robozinho, que se mete em muita confusão tentando ajudar todos que pode, de forma leve e divertida, sendo um excelente filme para ver com as crianças (que podem até achar o começo meio parado, mas vão se divertir bastante em sua última parte).

Para ser um filme complexo e falar de mais do que sua história, o filme não precisa ser chato. SEm Homem de Ferro, o grande industrial americano fica criando armas para destruir organizações terroristas que foram armadas por ele mesmo (alguém precisa que eu fale mais algo?). Depois de se divertir com explosões, sobra algo pra pensar.

Wall-E se destaca de outros filmes porque ele deixa mais do que um pensamento na cabeça. Mais do que um porque envolve várias coisas a se pensar. E mais do que um pensamento porque o fime se propõe a passar uma mensagem.

E, talvez mais importante, uma que vale a pena ser ouvida.

Inté,

A. N.

P.S: Juro que passo pelo menos umas duas semanas sem comentar mais de filmes... Só não prometo ficar calado depois de ver Cavaleiro das Trevas, que já estou esperando há um tempo, desde que disseram que o Coringa seria baseado no que aparece em a Piada Mortal. Embora o filme que eu mais esperava esse ano já tenha passado (Indiana Jones, meu herói de infância), ainda quero muito ver esse...

Um comentário:

Angelo A. S. Sampaio disse...

Muito bom a resenha, Aécio! Me fez ficar com vontade - novamente - de ver o filme. Vamos ver se ainda encontro ele para assistir por aih... :P Abraço!